Talvez
não
se pense que exista uma relação
mais aprofundada na semântica da palavra fisioterapia.
Talvez realmente não exista, visto que no cotidiano quase nunca se pense a
respeito. Sabemos que é derivada de duas outras gregas, physis e therapeía. De acordo com o
Dicionário Aurélio da língua portuguesa, fisioterapia é um tratamento de doença
por meio de exercícios e agentes físicos. Esta definição torna-se simplista por
desconsiderar, ou deixar apenas implícito as palavras movimento e natureza.
Desta forma, no cotidiano convencionou-se entender a fisioterapia apenas como
tendo seu lado concreto, seja pela realização de exercícios, seja pelo uso dos
agentes físicos como o frio, o calor, a eletricidade; e não é à toa que tanto
precisamos dos conhecimentos desta ciência (física) durante todo o aprendizado
que nos leva à profissão, afinal desempenhamos o papel de terapeutas dos
distúrbios relacionados à cinética.
Aprofundando-se no significado de
physis (algo mais apropriado para filósofos, do que para um fisioterapeuta)
compreendemos como sendo “natureza”,
mas em sentido amplo. Seu significado não pode ser entendido como sendo apenas
o conjunto de seres e agentes físicos que constituem o universo, mas sim, uma
força que mantém as coisas em constante “movimento”
(transformação), afinal, desde o momento da concepção estamos nesta eterna
mutação promovida por ele. Nascemos, crescemos, envelhecemos, mudamos durante
toda a vida. Não só estão presentes os movimentos naturais que nos trazem
mudanças fisiológicas. Surgem também as intempéries, as doenças que acarretam
inconstâncias indesejáveis. E por fim, a morte surge como mais uma etapa deste
ciclo de alterações.
Entre a gênese e a morte é onde
está compreendido o nosso trabalho. Daí surge mais uma possível análise
semântica e filosófica. A palavra em questão é “vida”. Obviamente cada um encara a interpretação da maneira que
melhor lhe convém, mas levando em consideração a ciência na qual estamos
inseridos, a fisioterapia, devemos relembrar de conceitos, palavras, expressões
que sempre estiveram onipresentes durante o período acadêmico. O conceito de
saúde adotado pela OMS; o termo “qualidade de vida”, que tanto é pregado nas
diversas disciplinas; a “funcionalidade” tão necessária para uma existência
plena. Todos estes conceitos estão presentes na formação acadêmica do
fisioterapeuta, contudo nenhum deles, para mim foi mais tocante do que uma
simples frase colada à parede da clínica escola da faculdade onde estudei.
Confesso que não lembro exatamente das palavras escritas, mas sua essência
permanece viva. Ela exaltava a vida não como o simples funcionamento dos
órgãos, ou a ausência de uma certidão de óbito, mas sim como algo que tenha
sentido e que valha a pena ser vivido. Era na verdade uma síntese de todos
estes conceitos anteriores, postos apenas em uma simples frase. Lembro-me
também que havia quem discordasse dela, utilizando o velho lugar-comum: “onde
há vida, há esperança”, frase baseada em um pensamento bíblico que exalta uma
virtude que está tragicomicamente relacionada à saúde pública do nosso país.
A vida do cidadão brasileiro
comum, desprovido de grandes bens materiais, é baseada no ato de ter esperança.
Utilizando mais uma vez o Aurélio, percebemos vários significados que se
encaixam no cotidiano do indivíduo que necessita de fisioterapia ofertada pelo
Sistema Único de Saúde: 1. Ato de se
esperar o que se deseja; 2. Expectativa, espera...
Enfim, a triste realidade das longas filas. Vale lembrar também, já que estamos
falando em virtudes, que o símbolo da esperança é uma âncora. Mais uma vez a
semântica se faz presente, mas podemos notar a ambiguidade que a palavra traz
em si. Na interpretação teológica, a âncora que simboliza a esperança significa
“suporte, segurança, abrigo”. Simultaneamente, quando pensamos em âncora surge
a ideia náutica, de um objeto que afunda e faz a embarcação ficar presa,
estagnada a algum lugar. Infelizmente estamos mais próximos do último significado
e daí surgem questões fáceis de responder, porém difíceis de compreender. Pergunta: seria a fisioterapia um
tratamento desnecessário, inútil, visto que há pouca oferta de vagas surgindo
nos concursos públicos e baixa remuneração oferecida? Resposta: não. Pergunta: A funcionalidade do indivíduo que passou por alguma lesão de qualquer
natureza será afetada pela grande demora das filas de espera do SUS? Resposta: sim.
Duas perguntas simples e duas respostas mais simples ainda. Então onde reside a
complexidade? Reside na frivolidade com que se trata a saúde do cidadão.
Deixando de lado as questões que envolvem o desinteresse político (que é mais
do que óbvio), não é fácil compreender o porquê de tamanho desconhecimento e
desvalorização de uma profissão séria que possui suas práticas baseadas em
evidências científicas e que acima de tudo não necessita de grandes
empreendimentos financeiros, comparado à tratamentos farmacológicos. Uma
possível resposta para essa questão é a grande oferta de profissionais no mercado.
Tomando este fato como a causa da desvalorização, nos vemos diante de um quadro
humilhante, onde estamos (nós fisioterapeutas e os cidadãos doentes) sendo
usados como marionetes, e a questão volta ao fato óbvio do desinteresse
político em beneficiar a população em prol de vãos interesses da politicagem.
Há quem diga que a culpa é de cada
profissional que não se valoriza, vendendo seu trabalho de forma particular a
preço irrisório. Há quem diga que a culpa é dos CREFITOS que não lutam por sua
classe, algo em que não acredito. Porém, a questão maior não é somente a
desvalorização do profissional da fisioterapia, mas sim a depreciação do valor humano, onde o cidadão tem sua semântica
desconsiderada, esquecendo o seu real significado. Cidadão: “indivíduo no gozo
dos direitos civis e políticos de um Estado, ou no desempenho de seus deveres
para com este”. Resta apenas seu outro significado: “habitante da cidade”, ao qual pode-se acrescentar: usável como objeto,
coisa.
Jhons Cassimiro - Fisioterapeuta CREFITO 7333
Jhons Cassimiro - Fisioterapeuta CREFITO 7333
Sábias palavras!
ResponderExcluirPorém, a questão maior não é somente a desvalorização do profissional da fisioterapia, mas sim a depreciação do valor humano, onde o cidadão tem sua semântica desconsiderada, esquecendo o seu real significado. Cidadão: “indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado, ou no desempenho de seus deveres para com este”